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Sexta-feira ,29 Março, 2024
Artigos de Opinião

Ler os sinais e reagir ou olhar para o lado e assobiar!

O Livro Verde do Poder Local
Há já algum tempo que me lembrei escrever sobre o assunto. O motivo foi-me despoletado pela publicação da nova Carta Administrativa Oficial de Portugal (CAOP), pelo Instituto Geográfico Português (IGP), em vigor desde 8 de Agosto de 2011, e pela consulta ao memorando da troika que dita que:

«Em Julho de 2012, o governo vai desenvolver um plano de consolidação para reorganizar e reduzir significativamente o número de tais entidades. O Governo vai implementar esse plano com base em acordo com o pessoal da CE e do FMI. Estas mudanças, que entrarão em vigor no início do próximo ciclo eleitoral local, vão melhorar o serviço, aumentar a eficiência e reduzir custos.»
Na altura fiz um pequeno exercício de cálculo do número de freguesias que respondiam ao critério de área superior a 25 km2 (um polígono quadrangular de 5 km que no momento me pareceu adequado como área mínima aceitável para uma freguesia). Fiquei estupefacto com o resultado pelo que logo imaginei uma reação idêntica dos membros da troika, ao proporem a redução de municípios e freguesias. Das 4.412 entidades referenciadas no CAOP 2010 para o país 3216 (73%) não cumpriam este critério, o que, muito embora seja um valor empírico, é revelador da falta de organização do nosso território. A atual situação acarreta custos enormes para o erário público, que podem ser substancialmente reduzidos em virtude dos progressos do desenvolvimento socioeconómico das últimas décadas do país e dos avanços tecnológicos disponíveis, entre outros, que permitem superar as dificuldades que justificaram a elevada densidade destas instituições públicas numa lógica de proximidade ao cidadão. Portanto, a medida da troika é louvável e sem ela provavelmente a reforma da administração local ficaria por fazer.

No estrito cumprimento desta medida da troika o Governo fez publicar, em Diário da República, a RCM n.º 40/2011, de 22 de Setembro, os princípios que definem a reforma da administração local autárquica. E, já ontem (26.09.2011), o Primeiro-ministro chamou os autarcas a São Bento e comunicou-lhes que “também chegou a hora da mudança para o poder local”, apresentando publicamente o “Livro Verde do Poder Local” que dá corpo à reforma, iniciando o debate nas instituições e na opinião pública.

A medida visa todos os municípios e freguesias, da qual resultará um novo mapa administrativo e um novo modelo de funcionamento autárquico, com a redefinição das competências e critérios de financiamento das autarquias. Cortar 35% no número de vereadores e cerca de 50% no número de dirigentes municipais, reduzir em mais de 1000 o número de freguesias e estimular a fusão de câmaras municipais, são algumas das mudanças que o Governo quer pôr em marcha e que estão previstas no Livro Verde do Poder Local.

Não é demais relembrar que, acima de tudo, esta reforma tem como objetivo principal a redução de custos no orçamento do estado, independentemente de o Governo poder alegar um conjunto de outras questões relacionadas com o território, eficiência administrativa, entre outras, com vantagens e desvantagens distintas consoante a localização e as características de cada município e freguesia. De referir, igualmente, que em todo este processo o “elo mais fraco” são as freguesias.

É de toda a importância que a freguesia de Alcanede não se alheie da discussão deste processo, que, em meu entender, deveria assumir-se do foro estratégico, não só para Alcanede como para todas as freguesias do norte do concelho de Santarém. E, quando escrevo isto, não só me refiro aos autarcas eleitos mas a todos os munícipes, se bem entendido, porque, em última circunstância, o que estará em causa é o futuro do nosso bem-estar.

Debater este assunto é algo que requer muito mais de que esmiuçar a proposta do Governo e participar na discussão pública. É necessário pensamento estratégico sobre uma visão futura para a freguesia e uma estratégia de atuação política concertada que vai muito para além dos limites da freguesia. Ora, pensamento estratégico sobre o desenvolvimento local da freguesia de Alcanede é algo que não existe, sendo este, em minha opinião, um dos problemas que mais afetou o desenvolvimento da freguesia na última década e que em certa medida já está a comprometer o seu futuro. Assistiu-se no passado recente, impávidos e serenos, a várias decisões políticas que nos deixaram à margem do progresso, adiando ou prejudicando a construção de infra-estruturas que favoreceriam o desenvolvimento socioeconómico da freguesia: o IP6, a ER361, o PDM, o posto da GNR, etc. Atualmente, um outro problema desenha-se no horizonte, motivado pela hegemonia da cidade de Santarém sobre as áreas rurais do concelho e que tem contribuído para um acentuar da desertificação de muitos lugares da freguesia, votando-a no futuro a um maior isolamento, sem capacidade reivindicativa, se não forem tomadas medidas atempadas para contrariarem esta tendência. São apenas alguns exemplos de situações que demonstram a necessidade de olhar o futuro da freguesia de Alcanede num horizonte mais longo, que vai muito para além do tempo dos mandatos autárquicos, com um maior contributo da sociedade civil na discussão e na resolução dos problemas da freguesia, nomeadamente, das suas organizações e do tecido empresarial produtivo.

A proposta do Governo para a reforma administrativa do poder local representa, para já, uma alteração de paradigma que é necessário estar atento. Obviamente, pela dimensão da freguesia de Alcanede (109,4 km2) não estará em causa qualquer processo de fusão, mas sim alterações no modelo de financiamento das freguesias o que poderá originar uma diminuição do atual valor do Fundo de Financiamento das Freguesias, assim como alterações ao nível das suas competências.

Em “conversas de café” apercebo-me que o assunto preocupa muito pouca gente, talvez por pensarem que é um problema que afetará mais diretamente as pequenas freguesias e que a freguesia de Alcanede sairá incólume desta reforma face à sua dimensão. Nada mais errado. A proposta do Governo tem por critério para o agrupamento das freguesias o rácio do n.º de habitantes/ km2, o que deixa a freguesia de Alcanede com o valor mais baixo se considerarmos as quatro freguesias do norte do concelho: Abrã (52,3 hab/km2), Alcanede (46,4 hab/km2), Amiais de Baixo (322,3 hab/km2) e Gançaria (130,4 hab/km2).

Se este for o critério adotado para o modelo de financiamento das freguesias, então, a freguesia de Alcanede perderá em toda a linha com esta proposta do Governo.

A discussão e debate público sobre os princípios e critérios está aberta e decorre entre o 4º trimestre de 2011 e o 1º trimestre de 2012, para que o Processo Legislativo na Assembleia da República possa ser concluído no 2º trimestre de 2012.

Os sinais estão dados, podemos agir ou olhar para o lado e assobiar!

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