Anunciado no dia 26 de Setembro pela Infraestruturas de Portugal (IP), finalmente a 2.ª fase da requalificação da Estrada Regional n.º 361 (ER-361) sai do papel para o terreno, dez anos volvidos após os primeiros anúncios e sete anos passados após a conclusão dos trabalhos da 1.ª fase, entre Alcanede e Amiais de Cima, feito alcançado, em grande parte, pela pressão exercida pelo Movimento Cívico pela Repavimentação da ER-361 sobre os poderes públicos. Que ninguém duvide!
É pois, com grande satisfação que assinalo este facto aqui no Portal de Alcanede mas ainda mais porque, de acordo com a informação da IP, são sete quilómetros de estrada, cuja intervenção incluí dois lanços que serão alvo de rectificação de traçado, com a eliminação de várias curvas, com o objectivo de obter uma melhoria significativa das condições de circulação e segurança rodoviária, dando continuidade à anterior intervenção concluída em 2012 (1.ª fase).
Foi um longo caminho, um verdadeiro calvário para quem conduziu a defesa e justificação da necessidade da beneficiação da estrada ER-361, com peripécias mirabolantes dos diferentes agentes políticos da acção governativa e dirigentes da administração pública envolvidos na decisão e prossecução do processo.
Agora, que este está na sua recta final, era digno de uma reportagem ou documentário televisivo de todo este historial, para que os portugueses vissem e percebessem o quanto é dificílimo alocar investimentos público para os territórios de baixa densidade populacional, independentemente das cores políticas que nos governam, ou da sua importância para o desenvolvimento local e da economia nacional.
Os dinheiros do erário público, que é como quem diz dos nossos impostos, ano após ano, só tem servido para acentuar as desigualdades entre territórios metropolitanos e rurais, à escala nacional e regional, e, por conseguinte, acentuando as desigualdades entre pessoas, de tal forma que a coesão territorial de Portugal Continental actualmente está posta em causa e a definição do longo caminho necessário para a sua resolução é uma autêntica miragem.
Hoje, numa faixa de 30 Km contada a partir do litoral, temos um país em agonia, a definhar a olhos vistos, a precisar de reformas estruturais de desenvolvimento territorial urgentes (a curto médio e a longo prazo), e só temos visto investimento avulso e a conta-gotas, anunciado com pompa e circunstância, em que tudo o que dá visibilidade se remedeia, mas que não dá para quase nada e tudo junto sabe muito a “poucochinho”. Ou seja, fazendo a analogia com a saúde, temos um território há anos doente que é tratado à base de paliativos para alívio da dor, ao invés de se lhe dar o tratamento para a sua cura.
Em sintonia com tudo isso, o que agrava exponencialmente a situação, temos os representantes políticos destes territórios desfavorecidos completamente resignados ao “status quo” existente. Há algumas excepções por aí, mas a maioria nada ou muito pouco faz para estancar esta sangria de gente que provoca uma espiral regressiva transversal a toda a sociedade e que está na origem do abandono do território, com todas as consequências e prejuízos que isso acarreta para o país. Em vez disso, alimenta-se muitas vezes a população à base de festarolas e outras distracções vistosas para turista ver e, assim se vai animando a malta, em vez de arregaçar as mangas e começar a tratar do problema “agarrando o boi pelos cornos”, como se diz cá pelo Ribatejo.
Não se pense pois, que a região de Alcanede por ainda possuir um tecido económico bastante activo está imune a este problema, os indicadores de população residente à muito constituem um aviso sério à navegação, em que, entre 2001 e 2011 a freguesia de Alcanede perdeu 10% da sua população e, pelos meus cálculos, entre 2011 e 2021, esse indicador vai continuar a agravar-se para 12 a 13 %. A agravante é de que essa perda não está a ser canalizada para a sede concelho mas sim para os concelhos vizinhos, e nisso, a melhoria das acessibilidades é uma das chaves para contrariar esta situação.
Para mim, o problema do desenvolvimento dos territórios de baixa densidade populacional não é tanto a falta de investimento público mas sim a falta de massa crítica. Não existem nestes territórios lideranças com capacidade para definir estratégias de desenvolvimento, reunindo consensos e sinergias nos agentes locais, com capacidade reivindicativa para captar investimento público e privado que sirva de alavanca ao desenvolvimento dos mesmos.
Veja-se o caso da Estrada Nacional n.º 362 (EN-362), uma via estruturante para a economia regional, em muito mau estado de conservação, cuja ligação à cidade de Santarém é fundamental para o desenvolvimento de todas as freguesias do norte do concelho (Alcanede, Abrã, Amiais de Baixo, Gançaria e Tremês), em que o investimento aprovado pelo governo para esta estrada se limitou à beneficiação do traçado existente. Portanto, mais um remedeio!
Ora, como todos sabemos, os transportes dos tempos de hoje e do futuro não se compadecem com traçados de estrada estreitos e sinuosos, como os da EN-362, por motivos de segurança e redução de tempo de deslocação de pessoas e bens, pelo que podemos considerar parte deste investimento dinheiro do erário público deitado à rua, por assim dizer. Assim como, uma perda de oportunidade para o desenvolvimento do concelho de Santarém, uma vez que vai demorar décadas até que se volte a realizar trabalhos de fundo neste troço da EN-362, adiando, desta forma, a correcção do seu traçado. Se não havia dinheiro para fazer a requalificação da EN-362 como deve ser, então que fizessem menos quilómetros, em duas ou três fases, já fomos habituados a isso na ER-361, não era o desejável mas seria compreensível. Afinal o país ainda há pouco tempo estava sob a alçada da Troika!
Acredito que poderíamos ter feito muito mais do que a manifestação pública de discordância deste investimento da IP nos moldes em que este está a ser realizado, mas para os que acreditam que ainda se pode mudar alguma, esqueçam que é tempo perdido. A obra está adjudicada e, alterações de fundo, obedece à anulação do contrato, com chorudas indemnizações para o empreiteiro.
Já lá vai o tempo em que era possível executarem-se trabalhos a mais mas, nisso, o Tribunal de Contas é hoje completamente inflexível. O tempo é pois de nos prepararmos para defender a requalificação do troço entre Alcanede e Valverde, com correcções no seu traçado.
Portanto, para mim, o resultado final da beneficiação deste troço da EN-362 é uma verdadeira desilusão! Não tanto pelo projecto de obra ficar aquém das expectativas, que já não me surpreende, porque é o costume, mas sim porque, pelos vistos, Alcanede não aprendeu nada com a experiência da ER-361, pois continua-se a cometer exactamente os mesmos erros do passado.
Luís Ferreira